quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Contos do Siará : página 2 comentada



Enquanto a embarcação lusa invade os verdes mares de Mucurã , hoje Mucuripe, dois nativos observam.

o diálogo começa com duas palavras na língua deles: "Caraíba sumarã"


o outro responde já em português : "Vamos avisar Jundaí." isso não quer dizer que ele fala em português mas assim começamos o texto para nossa compreensão, em outros locais usamos algumas palavras na língua própria do povo da terra apenas para ressaltar o 'indianismo'.


 Antes de tudo é preciso deixar claro que esses dois nativos não são tupis, eles são Kariris; 'caraíba sumarã" então significa : o inimigo branco. a explicação do léxico foi extraído de http://br.groups.yahoo.com/group/etnolinguistica/message/421

onde lemos:

Estudando o léxico Kariri, venho deparando com vários empréstimos de origem Tupi-Guarani. Isto, naturalmente, não é nada surpreendente, dada a ampla utilização do 'Tupi da costa' e das Línguas Gerais como línguas francas nos primeiros séculos da colonização (cf. Rodrigues, 'As línguas gerais sul-americanas'; vide referência abaixo) e o fato de que a grande maioria destes empréstimos se refere a itens introduzidos com a chegada dos portugueses ao Brasil.
Estes empréstimos incluem termos relativos à catequese (waré 'padre', crusá 'cruz', tupã 'Deus'), ferramentas e utensílios (tasi 'enxada', awi 'agulha', cramemu 'caixa', pyca 'banco', waruá 'espelho'), plantas e animais (bacobá 'banana', curé 'porco', sabucá 'galinha'), etnônimos (caraí 'homem branco',tapanhu 'negro) e outros elementos estrangeiros (miapé 'pão', tayu 'dinheiro'), etc. Mesmo alguns termos de origem portuguesa podem ter ingressado no léxico Kariri por intermédio de uma língua Tupi-Guarani (como, por exemplo, cabaru 'cavalo' e cabara 'cabra').
Estes termos parecem perfeitamente adaptados à morfologia Kariri (por exemplo, as palavras tayu'dinheiro', awi 'agulha' e tasi 'enxada', ocorrem, quando possuídas, com o prefixo u-, provável cognato de um morfema que marca posse alienável em outras línguas Macro-Jê).  Termos como estes são facilmente encontráveis em várias línguas não-Tupi, incluindo várias línguas Macro-Jê, como o Krenak e o Maxakali.
A identificação da origem de alguns prováveis empréstimos, no entanto, não é tão simples. Um deles égorá 'negro', que eu discuti em mensagem enviada à lista há alguns meses. Este termo, usado exclusivamente como etnônimo (portanto, um conceito introduzido com a colonização), ocorre também em Borum (Botocudo, Krenák): hinkora, hingora 'negro' (Rudolph 1909:9). Se possível, ficaria grato se alguém pudesse me fornecer respostas para as perguntas que fiz na mensagem referida acima: alguém teria alguma idéia quanto à origem desta palavra?  Seria mesmo de origem portuguesa (em última instância), como sugerido anteriormente (por Paula Martins)? Ocorreria em alguma outra língua?
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Um outro caso interessante (e, até agora, problemático) é a palavra Kariri s-u-marã 'inimigo (dele)', que é aparentemente idêntica ao Tupi Antigo sumarã 'inimigo' (Barbosa 1956:114). Enquanto a consoante inicial parece ser parte da raiz em Tupi Antigo (de acordo com a descrição do Pe. Lemos Barbosa), em Karirí é claramente um prefixo. Nesta língua, a forma de citação é marã 'inimigo'; a forma com o prefixo u- ocorre quando a raiz é possuída; s- é uma marca de terceira pessoa (cf. dz-u-marã 'meu inimigo', c-u-marã'nosso inimigo', d-u-marã 'seu (próprio) inimigo').
O fato de que a palavra é morfologicamente analisável em Kariri, mas não em Tupi, parece apontar para o Kariri como sendo a língua de origem. Mas, complicando um pouco a situação, ocorre também em Tupi a raiz verbal marã 'guerrear'. Em Karirí, a forma para 'guerrear' é maridza, relacionada provavelmente à forma nominal marã (parece haver um sufixo verbalizador -i em Kariri, muito pouco produtivo; -dza é provavelmente o prefixo pluralizador).  Mas, não obstante este fato, critérios morfológicos pareceriam indicar o Kariri como sendo a língua-fonte desta palavra, já que s- e u- são morfemas bastante produtivos nesta língua (não sendo segmentáveis no exemplo Tupi, aparentemente).**
Para solucionar este 'quebra-cabeça' etimológico, recorro, mais uma vez, aos colegas tupinistas da Etnolingüística. Se sumarã pode ser reconstruído para o Proto-Tupi-Guarani (ou mesmo para o Proto-Tupi), ou se esta palavra ocorre em várias línguas da família para as quais não há evidências de contato com o Kariri, é claro que a hipótese de origem Kariri não se sustenta.  Seja qual for a solução do problema, o resultado será igualmente interessante: (1) se a palavra é, de fato, de origem Kariri, este seria um dos raros exemplos de empréstimos 'na contramão', já que em geral foram as línguas Tupi-Guarani do leste brasileiro que agiram tradicionalmente como 'exportadores lexicais'; também seria uma testemunha interessante para o tipo de relações mantidas entre os Tupi e os Kariri; (2) se a palavra não é de origem Kariri, este caso demonstraria o quão produtivo o prefixo u- era, constituindo um exemplo interessante de  'etimologia popular'.

 Depois falaremos sobre a diferença entre as várias tribos nativas que estavam aqui no Siará; pois é importante saber que os "índios", erroneamente aprendemos a chamá-los assim, não eram um povo só, bruto, irracional, atrasado e ingênuo, muito pelo contrário, era um povo limpo, educado, natural e bravo; não eram santos, santos eram os que estavam chegando nos navios, eles eram culturalmente superior; seus costumes de honra era tão elevado que eles respeitavam tal honra acima de tudo.
E precisamente os Kariri, os Paiacu, Carijó, os Tremembé, os mais odiados e os mais perseguidos eram os mais puros que não queriam, em princípio, se corromper com a ambição do cristão europeu; já os tupis, prefeririam se render e negociar com os caraíbas, surgindo daí o brasileiro nato, o mestiço, o brasiliano, ohomem brasilis. Em contos do Siará quero me ocupar dessas relações diversas que surgiu do encontro desses povos, inclusive dos negros africanos, o terceiro elemento dessa miscegenação em Pindorama.

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